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Âmbito
A Geotecnia não é uma ciência pura, é sim o resultado do conhecimento de três áreas:
- Geologia de Engenharia,
- Mecânica dos Solos
- Mecânica das Rochas
Neste contexto, e procurando diferenciar o âmbito de actuação de cada uma delas, competirá, segundo Oliveira (1986):
- Á Geologia de Engenharia explicar a génese dos terrenos, fazer a sua descrição qualitativa e a sua caracterização quantitativa (tanto quanto possível), tendo em conta os problemas de engenharia a resolver e os impactes ambientais por eles criados.
- Á Mecânica dos Solos e à Mecânica das Rochas as tarefas de análise da estabilidade dos terrenos (respectivamente, terrosos para a primeira e rochosos para a segunda) e o projecto de estruturas que impeçam a sua instabilização ou garantam a sua estabilidade face às solicitações previsíveis.
Não existem fronteiras claras entre estas disciplinas. Por exemplo, entre a Mecânica dos Solos e a Mecânica das Rochas é difícil traçar uma linha de separação, como se pode deduzir destes dois exemplos inter-relacionados (Rocha, 1981):
- São frequentes as situações de obra onde estão simultaneamente envolvidas rochas e solos;
- Existem formações geológicas cujo comportamento é intermediário entre rochas e solos (também designadas por “rochas de baixa resistência”).
Contudo é possível definir o âmbito de cada uma destas disciplinas com alguma aproximação:
- A Geologia de Engenharia, na sua visão mais tradicional, ocupa-se da investigação da adequabilidade e características dos sítios, na medida em que eles afectem o projecto e construção dos trabalhos de engenharia civil e a segurança das construções vizinhas.
Como oportunamente sublinha Goodman (1993) o projecto e construção em engenharia civil desenvolve-se por fases, à medida que a informação técnica e científica é obtida, e a geologia de engenharia vai adquirindo diferentes responsabilidades em cada uma dessas fases. Segundo o British Standard Code of Practice for site investigations (BS 5930) este trabalho envolve os seguintes procedimentos:
- Investigação preliminar (análise dos dados disponíveis)
- Reconhecimento geológico detalhado de superfície, incluindo estudo fotogeológico
- Prospecção geofísica (obtenção de soft data do subsolo)
- Prospecção mecânica, incluindo sondagens (obtenção de hard data do subsolo)
- Ensaios de campo e laboratório para determinação das propriedades mecânicas dos solos e rochas (esta última fase em colaboração com a Mecânica dos Solos e a Mecânica das Rochas).
A Mecânica das Rochas debruça-se sobre o conhecimento dos maciços rochosos (Rocha, 1981) em termos de:
- Deformabilidade, isto é, das relações entre forças (ou tensões) e deformações;
- Resistência, isto é das condições que determinam a sua rotura;
- Estado de tensão inicial a que se encontra submetido;
- Dos estados de tensão que se desenvolvem em virtude das tensões aplicadas, incluindo as devidas à percolação da água subterrânea.
Por sua vez a Mecânica dos Solos trata dos problemas (Mineiro, 1981):
- De equilíbrio dos maciços terrosos sob a acção de solicitações exteriores (como seja a capacidade de carga de fundações superficiais e profundas),
- De resistência ao corte dos solos submetidos a esforços tangenciais;
- De escoamento em meios porosos, da consolidação e compressibilidade dos solos;
- De impulsos de terras sobre suportes (rígidos ou flexíveis, como sejam as cortinas ancoradas ou revestimentos de túneis)
- Do cálculo de estabilidade de taludes naturais e de aterro;
- Do comportamento dos solos sob solicitações dinâmicas (sísmicas)
- Do melhoramento de terrenos através de numerosas técnicas (injecção, pré-carga, compactação dinâmica, vibroflutuação, etc…).
A geotecnia como ramo independente da engenharia
Contudo, as causas dessa autonomia estavam “lá” desde o início, e são inerentes à natureza da grande maioria das construções, compostas por duas partes distintas – a estrutura e o terreno de fundação.
Como se sabe, as ciências da engenharia progrediram muito mais depressa relativamente à primeira (estrutura) quando comparada com a segunda (terreno de fundação). As razões desse progresso diferenciado residem no facto de:
- As estruturas terem formas geométricas simples e bem definidas e serem construídas com materiais “artificiais” (feitos pelo Homem) e com características fáceis de determinar, em condições propícias ao desenvolvimento das aplicações da física, especialmente da mecânica, e à previsão do seu comportamento – este é o âmbito das disciplinas de Resistência dos Materiais e Teoria das Estruturas, por exemplo.
- Os terrenos de fundação são constituídos por formações geológicas – solos e rochas – de características mecânicas mal definidas, que variam de ponto para ponto; frequentemente apresentam descontinuidades e fracturas que lhes conferem heterogeneidade.
Marcos históricos da geotecnia
Em termos formais podem ser apresentados os seguintes acontecimentos marcantes para o surgimento das disciplinas da Geotecnia:
- 1º Congresso da SIMSEF (Sociedade Internacional de Mecânica dos Solos e Engenharia de Fundações): 1936 em Harvard (USA);
- 1º Congresso da SIMR (Sociedade Internacional de Mecânica das Rochas): 1966 em Lisboa (Portugal);
- 1º Congresso da AIGE (Associação Internacional de Geologia de Engenharia): 1970 em Paris (França).
Contudo merecem ser mencionados alguns antecedentes que impulsionaram decisivamente o nascimento desta área do conhecimento científico, designadamente:
- Os trabalhos de Coulomb (1773) – conceitos fundamentais sobre a resistência ao corte dos solos enquanto soma de duas parcelas: uma devida ao atrito, proporcional à pressão normal à superfície de corte mas independente da área; outra devida à coesão, proporcional à área mas independente da pressão.
- A Lei de Darcy (1856) – do escoamento da água em meios porosos, segundo a qual existe uma relação constante entre a velocidade desse escoamento e o gradiente hidráulico que o produz, traduzido pelo coeficiente de permeabilidade, característica de cada meio poroso.
- A Teoria da consolidação de Terzaghi (1925) – com a consideração de duas fases constituintes dum solo saturado – a fase sólida e a fase líquida – e a divisão em duas parcelas da pressão total que nele actua – a pressão efectiva, na fase sólida e a pressão neutra, na fase líquida.
Razões para o rápido desenvolvimento da geotecnia
- Com o desenvolvimento das grandes concentrações urbanas os edifícios tornaram-se cada vez mais altos e, simultaneamente, os locais mais apropriados cada vez mais escassos.
- As barragens, muitas vezes fundadas em formações geológicas com características precárias, são das estruturas que mais contribuíram para o avanço da Geotecnia.
- A construção de túneis é também um poderoso motor de desenvolvimento da Geotecnia.
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