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Pleito
Pleito é mostrado pela sua origem de um termo do latim, mais especificamente de Placitu e seu uso no âmbito jurídico poderá levar o valor de questão judicial ou litigio, que por sua vez recebe tratamento de causa pelo tribunal devido um processo ou uma acção.
Porem, a palavra pleito é utilizada dentro do contexto eleitoral, normalmente com a intenção de fazer referência a uma disputa controlada entre candidatos de sentidos opostos.
Pleitos eleitorais
Ao contrário do que muitas vezes deixa parecer que pleito pode significar uma eleição, alguns estudiosos têm uma opinião contrária a esse entendimento, pois mostram diferenças claras da relação entre ambos os conceitos.
Desta maneira, o pleito será uma forma de disputa ou discussão entre candidatos para a disputa de algum cargo de classificação pública. Diferentemente da conhecida eleição, que é a escolha de um determinado candidato que está dentro da composição do pleito. Por isso, somos levados ao entendimento de que uma eleição está composta no pleito.
Para BOURDIEU (1987), a eleição é um dispositivo para preencher um cargo ou posto através de escolhas feitas por um corpo designado de pessoas: o eleitorado. No fundo, as eleições são o mecanismo através do qual o povo soberano legitima o exercício do poder legislativo, e – directa – ou indirectamente – do poder executivo para um tempo determinado.
Portanto, pode se perceber nestas definições que as eleições constituem mecanismos de delegação do poder, delegação essa, que é o acto pelo qual “uma pessoa dá poder, como se diz, a outra pessoa, a transferência de poder pela qual um mandante autoriza um mandatário a assinar em seu lugar, a agir em seu lugar, a falar em seu lugar, pela qual lhe dá uma procuração.
O papel das Eleições
Seguindo a linha de pensamento de STOKES (2006), no ponto de vista do mandato, as eleições servem para seleccionar boas políticas ou políticos que sustentam determinadas políticas, portanto, os partidos ou os candidatos fazem propostas políticas durante a campanha e explicam como essas propostas poderiam afectar o bem-estar dos cidadãos, os quais escolhem as propostas que gostariam de vê-las implementadas, bem como das pessoas que se encarregarão de as emplementá-las.
É esta lógica que, segundo BOURDIER (1989), leva o campo político a ser descrito como sendo o lugar em que se geram, na concorrência entre os agentes que nele se acham envolvidos, produtos políticos, problemas, programas, análises, comentários, conceitos, acontecimentos, entre os quais os cidadãos comuns, reduzidos ao estatuto de «consumidores», devem escolher, com probabilidades de mal-entendido tanto maiores quanto mais afastados estão do lugar de produção.
No ponto de vista de prestação de contas, as eleições servem para manter o governo responsável pelos resultados de suas acções passadas. Para STOKES (2006), nesta linha de pensamento, as eleições servem para sancionar (não votar no mesmo candidato ou partido) os governantes que não satisfizeram os seus eleitores durante o seu mandato, ou premiar (votando de novo no mesmo governo) os governantes que tiveram bom desempenho durante o seu mandato.
De acordo com DOWNS (2007), os incumbentes, bem como os eleitores são racionais. Portanto, uma vez que os eleitores são racionais cada um deles concebe as eleições estritamente como meios de selecção de governo que mais o beneficiará.
O Caso de Moçambique
O primeiro postulado segundo o qual as eleições servem para seleccionar boas políticas ou políticos que sustentam determinadas políticas, é problemático em Moçambique. Porem, como evidencia WALL (2003), este postulado é problemático primeiro, porque no sentido radical, os partidos moçambicanos não são programáticos, segundo, porque a maioria dos moçambicanos não se interessa em analisar os programas políticos.
Nota-se que neste postulado está subjacente a ideia de que os eleitores recebem os manifestos eleitorais dos diversos candidatos ou partidos políticos, analisam-nos e finalmente escolhem o candidato ou partido político que apresenta o melhor manifesto, este que posteriormente seria transformado num programa de governação.
Porem, corroborando com o acima exposto, seria importante evidenciar a existência de visíveis atropelos a lei eleitoral, por exemplo, no período da campanha eleitoral como: dificultar comitivas de partidos da oposição em suas missões de campanhas, perseguições aos que assumem ser de partidos na oposição entre outros.
No ponto de vista de prestação de contas, como analisa WALL (2003), as eleições servem para manter o governo responsável pelos resultados de suas acções passadas, isto significa que os eleitores fazem um voto retrospectivo.
Portanto, este postulado não se encaixa no contexto moçambicano onde até hoje (42 anos de independência), ainda existem crianças a estudar em baixo das árvores e sem carteiras embora Moçambique seja exportador da madeira, carência ou falta de transporte, sobretudo terrestre, morosidade na tramitação de certos procedimentos administrativos, fraca cobertura da rede de abastecimento da água potável e da corrente electiva, casos de corrupção que envolve funcionários públicos em fim uma série de problemas que inclui o mau provimento de bens e serviços básicos à população.
Este postulado é problemático dado que embora existam esses problemas, verifica-se que o mesmo partido que governou o país no período pós-independência é o mesmo que governa desde a introdução do multipartidarismo. Ou seja, é o mesmo partido (FRELIMO) que ganhou as eleições de 1994; 1999; 2004; 2009 e 2014 independentemente do seu performance governativo.
Os pleitos eleitorais em Moçambique
Periodicidade das eleições em Moçambique
De acordo com MATSIMBE (2018), até princípios da década de 1990, era um sonho ainda pensar em ter um dirigente eleito em muitos países da África austral, dada a inexistência de democracia em grande parte dos países da região. Experiências democráticas, consubstanciadas em processos eleitorais e multipartidários, começam a florir com o fim da Guerra Fria, com uma transição política de larga escala que ficou conhecida como “terceira onda de democratização”.
Porem, para o caso de Moçambique, com assinatura do Acordo Geral de Paz em 1992, deu lugar a realização das primeiras eleições no país e acordou-se que seguiria um calendário de 5 em 5 anos.
Alicerces do Sistema Eleitoral em Moçambique
O sistema eleitoral moçambicano, tem como sustentáculo o Acordo Geral de Paz de 1992 . Este, sobretudo o protocolo III, traça os princípios que norteiam o processo eleitoral. O protocolo advogava que a lei eleitoral estabelecerá um sistema eleitoral que consagra os princípios de voto directo, igual, secreto e pessoal; as eleições da Assembleia da República e do Presidente da República serão realizados concomitantemente, onde as primeiras eleições teriam lugar em 1993. Segundo BRITO et al (2010), as comissões mistas previstas naquele texto foram formadas tardiamente, trabalharam com dificuldades, e as eleições previstas para o ano seguinte (1993) só viriam a acontecer um ano depois, em Outubro de 1994.
O direito a voto ficou reservado aos cidadãos moçambicanos maiores de 18 anos excepto os incapacitados mentalmente ou dementes, bem como os detidos e condenados à prisão por crimes dolosos. Este direito ficou condicionado à inscrição nas listas eleitorais.
Eleição do Presidente da Assembleia da República
No que concerne à eleição da Assembleia da República, o protocolo III do AGP, assiste que as províncias do país constituirão os círculos eleitorais, cabendo à Comissão Nacional de Eleições decidir o número de assentos de cada círculo com base na densidade populacional de cada província; para a eleição da Assembleia, a lei eleitoral estabeleceu um sistema eleitoral proporcional; são elegíveis a Assembleia os cidadãos maiores de 18 anos. As partes acordaram que seria estabelecida uma percentagem (não inferior a 5% ou superior a 20%) mínima dos votos expressos à escala nacional sem a qual os partidos concorrentes não poderiam ter assentos na Assembleia.
Segundo BRITO et al (2010), a proposta de estabelecer a barreira ao nível de 20% foi da RENAMO, em total contradição com o espírito do sistema de representação proporcional, ele próprio adoptado em Roma sob proposta da RENAMO foi acordado também que os representantes dos partidos em cada círculo eleitoral serão eleitos em conformidade com a ordem da sua apresentação nas listas.
Eleição do Presidente da República
Segundo o protocolo III do AGP, o presidente da República é eleito por maioria absoluta dos votos expressos, se nenhum candidato obtiver a maioria absoluta, proceder-se-á a um segundo escrutínio entre os dois candidatos mais votados no prazo entre uma a duas semanas após a divulgação dos resultados; serão elegíveis a Presidente da República os cidadão eleitores, maiores de 35 anos.
As candidaturas para Presidente da República devem ser apoiadas por um mínimo de 10000 assinaturas de cidadãos moçambicanos maiores de 18 anos com capacidade eleitoral activa. De salientar que a Constituição de 1990 previa um apoio de 5000 eleitores.
Abstenções
A análise das eleições desde 1994 mostra um crescimento significativo da abstenção, que atingiu níveis muito altos nas ultimas eleições (oficialmente 64%, mas na realidade cerca de 50%). Este crescimento acelerado é revelador de um processo de desengajamento dos cidadãos em relação ao sistema político, sendo, portanto, um sintoma de crise do processo democrático.
Uma das características da geografia eleitoral em Moçambique é uma clara polarização espacial do voto entre a FRELIMO e a RENAMO. Essa estrutura espacial manteve-se nas eleições de 1999 e 2019, sem alterações apreciáveis, a não ser as que resultaram do grande aumento da abstenção. A cartografia eleitoral23 permite verificar que a abstenção afectou sobretudo zonas onde a RENAMO tinha uma influência notória. Ao mesmo tempo, comparando as votações de 1999 e 2004, pode-se observar que a FRELIMO manteve em 2004 praticamente o seu eleitorado de 1999, enquanto a RENAMO perdia cerca de metade do seu voto.
Bibliografia
BOURDIER, Pierre. 1989. A representação política: elementos para uma teoria do campo político. In O Poder simbólico, translated by Fernando Tomaz, 162–203. Lisboa: Difel.
BRITO, Luís de, et al. 2010. O sistema eleitoral: uma dimensão crítica da representação política em Moçambique. In Desafios para Moçambique 2010, 17–29. Maputo: IESE.
DOWNS, Anthony. 2007. Acção Democrática em uma economia teórica. Journal da Economia Politica. Estudos Africanos.
MATSIMBE, Zefanias A.2018. Estudos Eleitorais em África: Desafios Teóricos, Metodológicos e Conceituais. Estudos Africanos.
República de Moçambique. 1990. Constituição da República.
WALL, Nicolas van de. 2003. Presidencialismo e Clientelismo em África: Sistema de Partidos de Emergencia. Journal of Modern, Estudos Africanos.